27 julho 2011

LV-1-CAPÍTULO 11

 CAPÍTULO 11



Da paz e do zelo em aproveitar

1. Muita paz podíamos gozar, se não nos quiséssemos ocupar com os ditos e fatos alheios que não pertencem ao nosso cuidado. 

Como pode ficar em paz por muito tempo aquele que se intromete em negócios alheios, que busca relações exteriores, que raras vezes e mal se recolhe interiormente? 

Bem-aventurados os simples, porque hão de ter muita paz!

2. Por que muitos santos foram tão perfeitos e contemplativos?

 É que eles procuraram mortificar-se inteiramente em todos os desejos terrenos, e assim puderam, no íntimo de seu coração, unir-se a Deus e atender livremente a si mesmos.

 Nós, porém, nos ocupamos demasiadamente das próprias paixões e cuidados com excesso das coisas transitórias. 

Raro é vencermos sequer um vício perfeitamente; não nos inflamamos no desejo de progredir cada dia; daí a frieza e tibieza em que ficamos.


3. Se estivéssemos perfeitamente mortos a nós mesmos e interiormente desimpedidos, poderíamos criar gosto pelas coisas divinas e algo experimentar das doçuras da celeste contemplação. 

O que principalmente e mais nos impede é o não estarmos ainda livres das nossas paixões e concupiscências, nem nos esforçamos por trilhar o caminho perfeito dos santos. 

Basta pequeno contratempo para desalentarmos completamente e voltarmos a procurar consolações humanas.

4. Se nos esforçássemos por ficar firmes no combate, como soldados valentes, por certo veríamos descer sobre nós o socorro de Deus. 

Pois ele está sempre pronto a auxiliar os combatentes confiados em sua graça: Aquele que nos proporciona ocasiões de peleja para que logremos a vitória. 

Se fizermos consistir nosso aproveitamento espiritual tão somente nas observâncias exteriores, nossa devoção será de curta duração.

Metamos, pois, o machado à raiz, para que, livre das paixões, goze paz nossa alma.


5. Custoso é deixar nossos costumes; mais custoso, porém, contrariar a própria vontade. Mas, se não vences obstáculos pequenos e leves, como triunfarás dos maiores? 

Resiste no princípio à tua inclinação e rompe com o mau costume, para que te não metas pouco a pouco em maiores dificuldades.

Oh! Se bem considerasses quanta paz gozarias e quanto prazer darias aos outros, se vivesses bem, de certo cuidarias mais do teu adiantamento espiritual.